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02/08/2019 Alimentação

Pão: a base da alimentação de diversas culturas

Quando falamos em pão, a tendência geral é imaginar aquele pão quentinho e fofinho, feito de farinha de trigo, o pão francês ou pão caseiro. Hoje vamos falar de outros pães e outras matérias primas. Infelizmente o trigo que utilizamos, milenarmente, símbolo do pão para a cultura européia e introduzido pelos países coloniais nas Américas, sofreu modificações genéticas nos anos 80, e passou a causar reações alérgicas cada vez mais graves. Algumas pessoas mais sensíveis reagem somente ao toque ou ao estar em um ambiente com farinha no ar. Outras simplesmente relatam uma sensação de leveza e bem estar ao passar uma temporada sem ingerir produtos com trigo.
Na antropologia culinária, encontramos que praticamente todas as culturas humanas possuem ou possuíram algum tipo de carboidrato na base de sua alimentação. Nas Américas, de Norte a Sul, o milho era o alimento sagrado, em suas diversas cores, assumindo forma de arepas, tortillas, tamales, humitas, pamonhas. Da América Central para o Sul, o milho se associou à mandioca como alimento gerador de energia, em diferentes formas de preparar tapiocas e bolinhos, como os beijus e chipas da cultura guarani.
A simples mandioca cozida ainda acompanha diariamente as refeições no interior do Brasil e no Paraguai. Nos Andes, além do milho, há a quinua e centenas de variedades de batatas.
Esta diversidade rica em nutrientes, formas, cores e sabores, foi, ao longo do tempo, sendo substituída pelo pão cristão de farinha de trigo branca, refinada, como comida de classes sociais mais abastadas. Nas missões jesuíticas, só era permitido aos indígenas comer suas deliciosas chipas (chipa = pão, em guarani), elaboradas com milho e mandioca, em dias de celebração. No dia a dia, eram obrigados a comer o pão de trigo.
No México preparar tortillas com farinha de trigo é sinal de classe alta. Tortillas de milho são alimento de pobre. Tortillas de trigo são servidas em restaurantes. Atualmente, com os subsídios do governo, a farinha de trigo branca, ultraprocessada, é um dos “alimentos” mais baratos do mercado e também dos mais empobrecidos em termos de nutrientes.
Os pães ancestrais são simples de preparar, práticos e deliciosos. Aqui trazemos algumas receitas de nossa rica América.

Mbejú Mestiço – Foto: https://micorazondearroz.com/mbeju/

MBEJÚ MESTIÇO
No Paraguai a tapioca de polvilho é misturada à farinha de milho, o que enriquece a iguaria em sabor e valor alimentício. Experimentamos agregar ainda mais riqueza adicionando outras sementes moídas como linhaça, gergelim, chia, farinha de jatobá, pupunha, algarroba, coco ralado e o que mais surgir na mente.
Pelo menos 1/8 do total de massa é polvilho, doce ou azedo. É o que ajuda a ligar. Polvilho azedo dá um leve sabor de queijo. O restante vai da criatividade ou preferência de cada um.
Misture bem as farinhas secas. Acrescente sal, se desejar. Vá adicionando água aos poucos, para formar uma farofa úmida, que ao apertar com a mão faz um bolo, mas desfaz fácil. Aqueça uma frigideira e coloque a massa sem óleo. Aperte as bordas com o lado côncavo de uma colher. Aguarde mudar levemente de cor e soltar as bordas, mostrando que está cozido. Vire para assar do outro lado. Retire e coma ainda quentinho puro ou com recheio de abacate, queijo, tomate, óleo de coco, manteiga, patês, etc.

Chipa Guarani – Foto: Luciana Guidoux Kalil

CHIPA GUARANI
Segundo Margarita Miró, antropóloga especializada em culinária paraguaia, existem mais de 70 receitas de chipa, o pão sagrado guarani. Aqui trazemos uma receita que provavelmente é das mais antigas, já que antes da chegada dos espanhois os indígenas não consumiam leite nem ovos.
– 2 xícaras de polvilho doce
– 2 xícaras de farinha de milho
– 2 xícaras de coco ralado fino
– Purê de abóbora para dar o ponto
– 1 colher (sopa) de erva-doce amassada com as mãos
– 1 colher (chá) de sal
– 1 colher (chá) de bicarbonato de sódio
Misture bem o polvilho, a farinha de milho, o sal e a erva-doce. Adicione aos poucos o purê de abóbora, amassando com as mãos, até ficar uma massa moldável bem consistente, pesada, um pouco quebradiça. Aqueça o forno a fogo alto (250-300 graus). Adicione o bicarbonato de sódio à massa, misturando bem. Unte uma forma com óleo de coco. Enrole os pãezinhos, da forma que preferir: rosca, compridos, redondos, meia lua ou chatos. Leve ao forno bem quente, até dourar. São deliciosas quentinhas, acompanhadas de chá, mate ou café.

Arepas – Foto: Luciana Guidoux Kalil

AREPAS (Colômbia, Venezuela) ou PUPUSAS (México e América Central)

– 2 xícaras de farinha de milho (fubá)
– Sal a gosto
– Água fervendo
– 1 pitada de bicarbonato de sódio
Coloque a farinha de milho, o bicarbonato e o sal em uma vasilha. Misture bem. Adicione água fervendo aos poucos, mexendo com uma colher de pau, até tomar consistência de massa modelável. Espere esfriar um pouco. Faça bolinhos chatos de 2cm de espessura, 8-10cm de diâmetro. Asse em frigideira quente, primeiro de um lado, e quando soltar fácil, vire e asse do outro lado. É possível rechear as arepas antes de assar, os recheios mais comuns são queijo, feijão preto, purê de abóbora. Deliciosas quentinhas! Se preparar sem recheio, após assadas podem ser abertas ao meio e recheadas com guacamole ou outro recheio de sua preferência.
Com a mesma massa, é possível preparar tortillas. Basta fazer uma bolinha e apertar entre dois sacos plásticos. Soltar a massa do plástico e assar em frigideira quente de um lado e quando muda de cor virar e assar do outro lado, e virar novamente apertando um pouquinho com uma espátula para inflar. Perfeito para preparar tacos e burritos.

“A cozinha é o laboratório onde se fabrica a saúde ou a doença da família”
Margarita Miró Ibars

Colaboradores

Luciana Guidoux

lunaca@mailoo.org