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07/07/2018 Relações Comunitárias

Ubuntu: O “nós” e as relações comunitárias

Ubuntu e as Relações Comunitárias
Você deve estar se perguntando: “que palavra é essa Ubuntu?!! ”. Pois bem, Ubuntu é uma palavra africana Zulu, do grupo linguístico bantu, e que significa “sou o que sou pelo que nós somos”, ou seja, é uma palavra que define muito bem a vivência com o outro, para outro, em relação ao outro.
O significado humanístico do Ubuntu, entendido enquanto relações solidárias, relações de cooperação, respeito mútuo, acolhimento, generosidade, tem por finalidade a convivência harmoniosa, compartilhada e comunitária.
Ubuntu poderia levar-nos a associar com a ideia de relação comunitária? Vejamos…
Relação comunitária entende-se como a relação que visa o bem estar comum, o viver bem de todos os indivíduos que compartilham daquela realidade, daquele grupo, daquele espaço. Para tanto é necessário que haja o engajamento de todos nas decisões, isto é, as decisões precisam ser democráticas e participativas, como também praticadas pelos indivíduos que compõem o grupo.
Para ser harmônica e equilibrada, a relação comunitária precisa ser igualitária, logo, os indivíduos desta relação precisam compreender seus direitos e tê-los assegurados, como também assimilar seus deveres e cumpri-los. Caso contrário, a relação deixa de ser comum(itária) para ser desigual, injusta, excludente e assim por diante.
Logo, na relação comunitária a filosofia que deve permear o ideário do grupo é o Ubuntu que, como vimos, compreende o ser-indivíduo enquanto ser-em relação, ser-com, ser-para: “sou o que sou pelo que nós somos”.
A relação comunitária, se baseada neste princípio, entenderá o ser-indivíduo enquanto único, com sua identidade, vivência, experiência, vontade, ancestralidade, opinião, visão de futuro, mas também este mesmo ser-indivíduo como um ser-em relação, ser-com, ser-para e, sendo assim, ele compartilha, ele colabora, coopera, acolhe, respeita, convive, aprende, na e para a relação com o outro.
A relação comunitária precisa se apropriar do conceito humanístico do Ubuntu, citado anteriormente, para que seja possível a vivência em comunidade.

Relações comunitárias e sociedade
O caro leitor pode perguntar: o que isso tudo tem a ver com a sociedade em que vivemos? E ainda: o que isso implica no cotidiano das relações que são travadas no meio em que vivo?
Se pensarmos na unidade “Comunidade”, podemos entendê-la na dimensão direta do convívio do ser-indivíduo com o outro. Nesta perspectiva a aproximação das ideias, vontades, visão de futuro e demais, estão muito próximas constituindo o grupo que compõe a comunidade na vivência da relação comunitária.
Porém, nem todo mundo pensa igual, nem todo mundo quer as mesmas coisas, tem a mesma visão de onde quer estar daqui a tantos anos, e essa diversidade faz com que grupos diferentes se formem, fazendo com que coexistam diversos grupos comunitários, ou seja, diversas comunidades cada qual com características de relações comunitárias diferentes.
Claro que não cometeremos o equívoco de acreditar que não veremos traços de ideias, comportamentos, valores e posturas de uma comunidade em outra, ao contrário, é esta similaridade ou esta assimilação de características comuns que une as comunidades e forma o que conhecemos como Sociedade.
A sociedade, porém, não pode ser entendida como a soma das partes, mas a interconexão e a inter-relação das partes formando um todo. E esta formação do todo-sociedade nos remete ao conceito inicial de Ubuntu, de modo que esta interconexão também precisa unir as partes-comunidades, auto-solidárias, auto-cooperativas, auto-complementares, para que a Sociedade composta por esta conexão seja saudável, harmoniosa, justa e, principalmente, humanizada.
Tomemos como exemplo a Sociedade Brasileira. Por mais diferenças que existam entre a população que vive na região nordeste e a que vive na região sudeste sempre haveremos de encontrar algo que nos une, que nos aproxima, em que nos identificamos uns com os outros.
São estas conexões que fazem com que nos entendamos enquanto sociedade brasileira. Estas conexões não se limitam a língua oficial (Língua Portuguesa) ou a territorialidade geográfica que limita o país, nem aos símbolos nacionais que nos representam. Esta conexão está na representação subjetiva de pertencimento ao “grupo Brasil”, na cultura, no esporte, nas formas como manifestamos fé, nos valores, nas tradições, nos costumes etc. Esse conjunto de conectores faz com que a sociedade brasileira seja assim identificada e isso só ocorre porque esta sociedade está em relação com outras sociedades.
Observamos, portanto, que a relação comunitária é cíclica: indivíduo-comunidade-sociedade-mundo-indivíduo.

Ubuntu na prática
Sabemos o quanto é difícil na vivência mesma das relações humanas, em específico nas relações sociocomunitárias, tornar o Ubuntu uma realidade no contexto em que vivemos. Contexto este de uma sociedade estruturada na desigualdade e não na diversidade; nos preconceitos das diferenças e não na aceitação das singularidades; na prática de valorização do “eu” em detrimento do “nós”; na igualdade dos indivíduos e não na equidade dos seres.
Esse conceito africano que aqui, no nosso contexto social, encontra tanta fragilidade prática, foi apresentado com o objetivo de mostrar que há caminhos e possibilidades de repensarmos as relações que queremos enquanto indivíduo-grupo e enquanto comunidade-sociedade.
Esta foi só uma introdução dos bate-papos que teremos daqui por diante, em que poderemos compartilhar exemplos e modelos de relações comunitárias que mostram que na prática já estamos nos movimentando, já estamos nos estruturando e organizando para tornar cada vez mais possível o dia em que seremos vistos como a sociedade que conseguiu se espelhar no modelo africano de vivência comunitária, cuja filosofia é o Ubuntu: “sou o que sou pelo que nós somos”.

Colaboradores

Vania Rocha

vaniarochasocial@gmail.com